A minha função espiritual faz de mim uma intermediária entre o humano e o sagrado e para exercê-la da melhor maneira possível tenho como instrumento o Jogo de Búzios. Pessoas de diferentes idades, raças e até mesmo credos, buscam a ajuda desse oráculo. Surpreende-me o fato de que uma grande parte dos que me procuram sente-se vítimas de inveja.
Engraçado é que nunca, nem um só dia sequer, alguém chegou pedindo-me ajuda para se libertar da inveja que sentia dos outros. Será que só existem invejados? Onde estarão os invejosos? E o pior é quando consulto o oráculo e ele me diz que os problemas apresentados não são decorrentes de inveja, a pessoa fica enfurecida.
Percebo logo que existe ali uma profunda insegurança, que gera uma necessidade de autovalorização. Se isso ocorresse apenas algumas vezes, menos mal, o problema é que esse comportamento é uma constante.
Isso me leva a pensar que cada pessoa precisa olhar dentro de si, tentar perceber em que grau a inveja existe dentro dela, para assim buscar controlar e emanar este sentimento, de modo que ela não venha a atuar de maneira prejudicial ao outro, mas principalmente a si, pois qualquer energia que emitimos, reflete primeiro em nós mesmos.
Uma fábula sobre a inveja serve para nossa reflexão: Uma cobra deu para perseguir um vagalume, cuja única atividade era brilhar. Muito trabalho deu o animalzinho brilhante à insistente cobra, que não desistia de seu intento.
Já exausto de tanto fugir e sem possuir mais forças o vagalume parou e disse à cobra: –Posso fazer três perguntas?
Relutante a cobra respondeu: –Não costumo conversar com quem vou destruir, mas vou abrir um precedente. O vagalume então perguntou: -Pertenço à sua cadeia alimentar? - Não, respondeu a cobra. –Fiz algum mal a você-? -Não, continuou respondendo a cobra. -Então por que me persegue? -perplexo, perguntou o brilhante inseto. A cobra respondeu: –Porque não suporto ver você brilhar, seu brilho me incomoda.
Ingênuas as pessoas que pensam que o brilho do outro tem o poder de ofuscar o seu. Cada um possui seu brilho próprio, que deve estar de acordo com sua função. Existem até pessoas cujas funções requerem simplicidade, onde o brilho natural só é percebido através do reflexo do olhar do outro.
Lembro-me de uma garotinha de apenas 10 anos de idade que a mãe me procurou para ajudá-la, pois ela ficava furiosa quando não tirava nota dez na escola.
Comportamento que fazia com que seus coleguinhas se afastassem dela.
Algumas tardes eu passei conversando com a garota. Um dia ela chegou me dizendo que não apresentava mais o referido problema, que até tirou nota dois e não se incomodou.
Fiquei muito feliz, cheguei mesmo a ficar vaidosa, pois acreditei que aquela nova atitude era resultado de nossas conversas. Foi quando ela me disse:-Sabe por que não me incomodei de tirar nota dois, Mãe Stella? Ansiosa, perguntei:-Por quê? Ao que ela me respondeu: –Porque o resto da turma tirou nota um. Rimos juntas da minha pretensa sabedoria de conselheira e do natural instinto de vaidade que ela possuía e que muito trabalho teria para domá-lo. O desejo que a garota possuía de brilhar mais do que os outros, com certeza atrairia para ela muitos problemas. Afinal, ela não queria ser sábia, ela queria ser vista.
O caso contado anteriormente fez lembrar-me de outro que eu presenciei, onde uma senhora repleta de ouro insistia em me dizer que as pessoas estavam olhando para ela com inveja. Cansada daquele queixume, disse-lhe que quem não quer ser visto, não se mostra.
A inveja é popularmente conhecida com olho gordo. Se não queremos ser atingidos pelo olho gordo do outro, devemos cuidar para que nossos olhos emagreçam, não deixando que eles cresçam com o desejo de possuir o alheio.
Já que fazemos dieta para nossos corpos serem saudáveis, devemos também fazer dieta para nossos olhos, pois eles refletem a beleza da alma. A tendência agora é, portanto, olhos magrinhos, mas não anoréxicos, pois alguns desejos eles precisam ter, de preferência desejos saudáveis.
Maria Stella de Azevedo Santos é Iyalorixá do Ilê Axé Opô Afonjá
0 comentários:
Postar um comentário