sexta-feira, 25 de junho de 2010

Este é o prólogo

Deixaria neste livro toda minha alma.
Este livro que viu as paisagens comigo e viveu horas santas.
Que compaixão dos livros que nos enchem as mãos de rosas e de estrelas e lentamente passam!
Que tristeza tão funda é mirar os retábulos de dores e de penas que um coração levanta!
Ver passar os espectros de vidas que se apagam, ver o homem despido em Pégaso sem asas.
Ver a vida e a morte, a síntese do mundo, que em espaços profundos se miram e se abraçam.
Um livro de poemas é o outono morto: os versos são as folhas negras em terras brancas, e a voz que os lê é o sopro do vento que lhes mete nos peitos - entranháveis distâncias. –
O poeta é uma árvore com frutos de tristeza e com folhas murchadas de chorar o que ama.
O poeta é o médium da Natureza-mãe que explica sua grandeza por meio de palavras.
O poeta compreende todo o incompreensível, e as coisas que se odeiam, ele, amigas as chama.
Sabe ele que as veredas são todas impossíveis e por isso de noite vai por elas com calma.
Nos livros seus de versos, entre rosas de sangue, vão passando as tristonhas e eternas caravanas, que fizeram ao poeta quando chora nas tardes, rodeado e cingido por seus próprios fantasmas.
Poesia, amargura, mel celeste que mana de um favo invisível que as almas fabricam.
Poesia, o impossível feito possível. Harpa, que tem em vez de cordas chamas e corações.
Poesia é a vida que cruzamos com ânsia, esperando o que leva nossa barca sem rumo.
Livros doces de versos são os astros que passam pelo silêncio mudo para o reino do Nada, escrevendo no céu as estrofes de prata.
Oh! Que penas tão fundas e nunca aliviadas, as vozes dolorosas que os poetas cantam!
Deixaria no livro... neste toda a minha alma...
Federico Garcia Lorca
7 de agosto de 1918.

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